Os precursores do Verso livre
Os precursores do Verso livre
A 2ª Geração é responsável pela modernização da poesia sertaniense, com a adoção do verso livre, o uso de metáforas e de outras figuras de linguagem e um discurso poético antenado com os postulados da Escola modernista.
Corsino de Brito- O Bardo do Piutá
Corsino de Brito é de Sertânia-PE, poeta, contista, escritor, advogado, professor, ensaista, foi juntamente com Carlos Drumondd de Andrade e outros poetas,Frequentador da UNICABAL- Universidade do Calçadão de Copacabana, Rio de Janeiro-RJ, onde foi servidor do Tribunal de Contas do Estado. Em Pernambuco foi fundador da Frente Negra, com Solano Trindade. No Rio de Janeiro- RJ fez parte do Grupo da UNE- União Nacional dos Estudantes, que lançou o movimento “o Nosso Petróleo é nosso”, que abraçada por vastos segmentos sociais e políticos do País mais tarde se tornou a famosa campanha “O Petróleo é nosso!”.
Bolandeira velha
(Ou História sertaneja do Brasil)
Bolandeira velha de Pai Guilherme,
Velha Bolandeira das terras de Cachoeira,
No Sertão brabo de meu Pernambuco crestado.
Sertão varado de veredas encruzilhadas
Por onde as bandeiras de antanho,
Bandeiras do passado,
Verrumavam os horizontes
P ‘ras bandas do Rio São Francisco...
Ah! Bolandeira antiga
Esburacada, derreada,
Por onde dizem, ouvem –se
os passos de Pai Guilherme ás Madrugadas!
Bolandeira antiga
Joia do feudo da cachoeira-
Senhora de seiscentas cabeças de gado crioulo
E terras que se destendem do jabitacá a Barro Branco.
Há soletro a História,
Vejo nessa bolandeira um resumo do Brasil -Colonial
Uma síntese do Brasil- Império:-
O couro valendo ouro e a garapa ouro feito.
Bolandeira velha de Pai Guilherme
Barroco esfumado de um Brasil longevo,
caricatura rústica
do país hodierno que me viu nascer
e por onde hesito, e capengueio e erro
e sofro e brinco e vivo....
Tacho de caldeamento humano
Cujo mel ainda não deu ponto.
Búzio em chifre de boi,
Cuja modulação sonora é o gemido do negro,
O brado guerreiro do Pajé fogoso indomável
E a reclama do zíngaro, do batavo e do luso
Ofertando cachimbos,espelhos, braceletas!...
Bolandeira velha de Pai Guilherme,
rancho de pouso e pasto vasto
para almocreves e muares estropiados
na tração incessante dos produtos sertanejos:
semente de mamona, caroço de algodão,
casca de angico e alimária p`ros engenhos-
em troca de manufaturas e produtos de orla...
Pai Guilherme, Senhor feudal daquelas zonas,
Suas filhas, as sinhazinhas
Que montam em silhão enfeitado
E mandavam surrar os cabras enxeridos...
Pai Guilherme ordenava aos vaqueiros ferrarem
Toda rês recém- nascida encontrada na caatinga,
quer fosse quer não fosse de sua propriedade.
Pai Guilherme a mais fornida pilastra da fé Cristã
Na Moxotolina.
Pai Guilherme que mandava matar todo vaqueiro
Que delatasse, ou não cumprisse, aquele crime.
Mas, Pai Guilherme,
Coiteiro de escravos foragidos na caatinga...
A história do Brasil, porém vem se mudando
O bisneto de Pai Guilherme é pobre como Job,
Mas perscruta, n essa bolandeira antiga,
O milagre político da unidade física...
Bolandeira antiga,
Velha bolandeira das terras de Cachoeira,
Domínio de Nassau em alguma época,
Pelourinho e bota de opressão,
Espantalho de negros e mestiços,
Mas passadiço de descortino de Braisis,
Conglomerado de amarguras e epicismos,
Alfarrábio vivo da sociologia nacional
Sinto como que ,
Transpirando das paredes esburacadas,
Vultos e paisagens passados, passeando pelo ar.
Dá-me uma sensação gostosa
De passadismo e supertição,
De saudade e esquecimento
Essa bolandeira derreada,
E a figura de Pai Guilherme
Infunde-me respeito e orgulho,
E medo e intimidade lendária...
Não sei por que,
Á s vezes sou profundamente essa bolandeira:
Sinto-me enigmático, convulsionado, misterioso,
Por instante esburacado,
Destelhado, derreado e aniquilado, também.
Crivado de uma porção de histórias interiores,
Assoma-me a sensação de que já fui muitas criaturas,
E , não raro, pânico, até, de que ainda o sou.
Emaranhado, turvo, suspenso, pardo, misturado,
Esfumado, absorto, indefinível,
Mas tudo isso com uma realidade tenebrosa
De vultos se mexendo no escuro...
Possivelmente eu seja mesmo essa bolandeira!...
E como se não bastasse tão angustiosa parecença,
Pela bolandeira antiga, alecremente,
ao sol das tardes e das manhãs,
há graúnas e corvos , e sabiás,
canários amarelinhos construindo ninhos
pelos beirais da bolandeira antiga,
e ao pé das paredes centenárias
bale, ou descansa,
a carneirada mansa!...
Autor: Corsino de Brito
*Guilherme de Carvalho. No Sítio Cachoeira, possuía um chiqueiro com algumas cabras. Depois colocou uma bodega num quarto contiguo à casa. Posteriormente construiu um açude de pedra, montou uma engenhoca de madeira e instalou uma bolandeira de algodão. Em 1899, deu início a uma feira , que mais tarde originou o povoado Cachoeira de Guilherme (atual Distrito de Albuquerque- Né). Dirigindo –se a Vitória de Santo Antão para socorrer uma pessoa de sua comunidade, lá serviu de enfermeiro e acabou contraindo varíola. Faleceu longe dos seus , em terra estranha, virando um verdadeiro mito para aquela região de Sertânia. São seus descendentes Os Carvalhos : Carvalho de Sindor e Damião, Doura de Veríssimo, Paulo Mariano, Anacleto Guilherme de Carvalho... Esta Bolandeira de que trata o poema, serviu para dar nome a “Serra da bolandeira”.
MOZART LOPES DE SIQUEIRA
Mozart Lopes de Siqueira-Filho do Poeta e Médico Alcides Lopes de Siqueira e Esther.Mozart Lopes de Siqueira, é DE Sertânia-PE, foi advogado, jornalista, poeta e dramaturgo, tendo escrito e publicado livros de poesia, teatro e teoria sobre direito e filosofia.
O Homem como um rio
(Mozart Lopes de Siqueira)
O humano como um rio no seu leito:
Encaixotado.
O humano como um fruto em sua casca:
Empacotado.
O humano empacotado em seu corpo,
Nos seus dias, nos seus anos.
O humano como um rio no seu rumo
Sempre o mesmo. Em seu aquário
O humano com a fruta em sua casca
Sempre a mesma.
O humano e seu consumo:
O pão incerto, a casa incerta,
A vida incerta.
A vida sem janelas sempre a mesma:
Emparedada.
O Homem em meio a praça, à multidão:
Emparedado.
Na escola, no clube, na oficina
Como um peixe em seu aquário:
Emparedado.
A vida incerta
O humano com seu pasto
Duro pasto:
A pastagem dos dias mal vividos,
A pastagem das noites mal dormidas,
A pastagem da fome.
O Humano encaixotado no seu corpo,
Nos seus dias, no seu sal.
O sal humano, a inconsistência humana.
O Humano emparedado pelas noites
Pelos dias.Emparedado
Em sua mágoa. No trabalho
Na rua: emparedado.
Na multidão perdido:
Um simples número,
Um simples número encaixotado
Na moldura dos dias
E das noites.
Um simples corpo resumido
Em sua brevidade
Humana e pobre.
Um simples rosto na vidraça
Dos ônibus. Um número perdido
No vai e vem das ruas,
O humano emparedado numa noite
Sem clarões de madrugada.
Lá onde apenas se entremostram
As paisagens sedutoras das tardes domingueiras
Vestidas de amarelo
E as árvores vestidas de amarelo,
De um amarelo claro e vivo como um sol,
Lá onde se entremostra a pura paz,
a paz sonora e cor de rosa
e leve e tênue como um sonho
Categoria: Casa dos Poetas, Poetas de Sertânia
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